Jovem usa o celular na porta da escola — Foto: Freepik

O projeto de lei que restringe o uso de celular na escola deu mais um passo na semana passada, sendo aprovado por ampla maioria na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Pesquisa realizada pela Nexus em outubro mostrou que 86% da população brasileira são favoráveis a algum tipo de restrição nas escolas, sendo que 54% chegam a defender a proibição total. Trata-se, portanto, de uma medida com ampla aceitação popular, o que ajuda a explicar a facilidade com que a iniciativa tem avançado também em legislativos estaduais e municipais. No entanto, justamente pela baixa resistência à proposta, é importante atentar para alguns riscos.

Riscos

Um deles extrapola a sala de aula. Se estudantes compensarem o tempo que deixarão de utilizar celulares na escola aumentando seu uso imoderado em casa ou na rua, muitos dos efeitos prejudiciais à sua saúde e ao bem-estar, identificados em várias pesquisas, continuarão ocorrendo em algum grau. Em alguns países que baniram esses aparelhos de ambientes pedagógicos, foi justamente isso que ocorreu, conforme destacou um relatório da OCDE neste ano, já citado aqui. A conscientização e envolvimento das famílias, portanto, é essencial.

Mas há também riscos pedagógicos a serem considerados. Celulares hoje são a ferramenta tecnológica mais disseminada em todas as classes sociais. Através deles temos acesso a serviços, informações, entretenimento, oportunidades de trabalho ou a aplicativos que facilitam a comunicação e tarefas cotidianas. Ao mesmo tempo, são porta de entrada para a desinformação e geram dependência, distração e ansiedade, entre outros malefícios. É o uso que fazemos dele que determina se os benefícios superam os prejuízos.

Mesmo com as exceções para uso pedagógico previstas no texto da Lei, a mensagem geral de que celulares devem ficar longe da sala de aula pode, na prática, inibir que dimensões como o desenvolvimento de competências digitais e a educação midiática sejam devidamente trabalhadas. Isso prejudicaria, entre outros aspectos, o estímulo do pensamento crítico e da própria conscientização sobre os potenciais e cuidados necessários no uso de tecnologias.

Mais efeito colateral

Outro efeito colateral indesejado seria o desincentivo ao bom uso de tecnologias em favor da aprendizagem. Aqui é necessário reconhecer que hoje há muito mais joio do que trigo na oferta de soluções digitais às escolas. Mas fechar os olhos para o potencial que algumas estratégias mediadas pela tecnologia podem trazer para o campo educacional seria um grave erro.

Diante de tantas evidências sobre as consequências negativas do uso de celulares por crianças e jovens, era mesmo necessário um freio de arrumação. Mas a resposta das redes de ensino ao problema não pode se limitar apenas à restrição. Será fundamental, em paralelo, investir em formação, materiais didáticos e orientação às escolas para que não deixem de trabalhar dimensões tão fundamentais hoje para o exercício pleno da cidadania.

O Globo

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