Lançamento de míssil balístico intercontinental durante exercícios das forças de dissuasão nuclear — Foto: Handout / Russian Defence Ministry / AFP

A Rússia lançou um míssil balístico intercontinental (ICBM) em um ataque à cidade de Dnipro, no centro-leste da Ucrânia, na quinta-feira, pela primeira vez desde o início de sua invasão em 2022, acusou a Força Aérea da Ucrânia. Segundo os militares ucranianos, o armamento chegou a mil quilômetros de onde foi lançado, na região de Astrakhan, no sul da Rússia.

Esses tipos de mísseis são projetados para transportar ogivas nucleares e atacar alvos a milhares de quilômetros de distância. Os ICBM são disparos para o espaço e liberam uma ou mais ogivas que retornam à atmosfera. De acordo com o Centro de Controle de Armas e Não Proliferação, armamentos do tipo têm alcance mínimo de 5,5 mil quilômetros, mas suas versões mais avançadas podem ir a 9 mil quilômetros de distância.

Dias antes, Moscou havia anunciado que Kiev disparara pela primeira vez em mil dias de guerra mísseis de longo alcance, ATACMS, fornecidos pelos EUA contra o seu território, após autorização do governo de Joe Biden. A Rússia disse que o ataque marcava “uma nova fase” do conflito e prometeu uma resposta “adequada”.

“Um míssil balístico intercontinental foi lançado da região russa de Astrakhan”, disse a Força Aérea de Kiev, em comunicado divulgado nesta quinta-feira.

O disparo ucraniano, do ATACMS americano, teria ocorrido contra uma instalação militar na região fronteiriça russa de Bryansk, segundo a imprensa estatal. Os fragmentos de um míssil danificado provocaram um incêndio na instalação, que foi rapidamente extinto e não causou danos ou vítimas. Um funcionário de alto escalão ucraniano confirmou à AFP o uso dos mísseis, mas o governo ainda não fez uma declaração oficial.

Dos seis mísseis, cinco foram abatidos, afirmou o Ministério da Defesa.

“Às 3h25 (21h15 de Brasília, segunda-feira), o inimigo atacou uma área na região de Bryansk com seis mísseis balísticos. Segundo dados confirmados, foram utilizados mísseis táticos ATACMS de fabricados americana”, informaram as agências de notícias estatais, que citaram um comunicado militar, referindo-se aos Sistemas de Mísseis Táticos do Exército (ATACMS, em inglês).

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, não quis comentar o assunto durante uma entrevista coletiva em Kiev, mas a imprensa ucraniana, citando uma fonte militar, confirmou o uso dos mísseis fornecidos por Washington. O ataque teria causado 12 explosões secundárias.:

ATACMS: O que são os mísseis dos EUA que podem ser usados ​​contra a Rússia

Na segunda-feira, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, acusou a Ucrânia e o Ocidente de buscarem uma escalada e prometeu uma resposta “adequada” a futuros ataques. No Brasil para a cúpula de líderes do G20, o chanceler russo afirmou que o lançamento de mísseis americanos pelos ucranianos contra o território russo marca “uma nova fase da guerra”.

— Reagiremos de acordo — disse Lavrov, acusando antes Washington de ajudar Kiev a operar os mísseis: — Se há um lançamento de mísseis de longo alcance da Ucrânia até o território russo, quer dizer quer eles são operados por militares especialistas americanos.

O presidente dos EUA, Joe Biden, também presente no evento, instou os países presentes a apoiarem a soberania da Ucrânia.

Apesar de não confirmar o uso de ATACMS, Zelensky acusou os líderes do G20 reunidos no Brasil de não reagirem ao decreto assinado pelo presidente russo, Vladimir Putin, que amplia os motivos para recorrer ao uso de armas nucleares.

— Hoje, os países do G20 estão reunidos no Brasil. Eles disseram alguma coisa? Nada — afirmou durante entrevista coletiva em Kiev, na qual também denunciou a ausência de uma “estratégia forte” por parte dos países reunidos no Rio.

A nova doutrina russa afirma que um ataque de um Estado não nuclear, mas que seja apoiado por uma potência nuclear, será tratado como um ataque conjunto. O Kremlin afirmou que a revisão era “necessária para adaptar os nossos fundamentos à situação atual”.

A demanda pelo uso dos ATACMS era um clamor antigo dos ucranianos. Mas Washington, um de seus principais aliados no conflito, vinha rejeitando as exigências, temeroso de que seu uso pudesse escalar ainda mais a guerra ou até significar uma diminuição no estoque de armamentos americano. Assim, quando os primeiros ATACMS foram enfim enviados à Ucrânia em 2023 com um alcance menor, de 160km, uma condição era que eles não fossem usados para ataque no território russo.

Nesta terça, o chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell, pediu aos países do bloco que também permitissem que a Ucrânia usasse armas de longo alcance fornecidas por eles para atacar alvos dentro da Rússia.

— Espero que todos os Estados-membros (da UE) sigam a decisão dos Estados Unidos — disse Borrell ao chegar para uma reunião de ministros da Defesa dos países do bloco em Bruxelas, concluindo: — A guerra contra a Ucrânia afeta diretamente nossos valores e princípios. O destino dos ucranianos determinará o destino da UE.

Borrell também condenou a ameaça russa, classificando-a como “irresponsável”. Argumentou que “a Rússia aderiu ao princípio de que uma guerra nuclear não pode ser vencida e, portanto, nunca deve ser travada.”

Na mesma linha, o secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), Mark Rutte, também presente na reunião, afirmou que é “crucial que Putin não consiga o que quer”, uma vez que isso deixaria uma Rússia fortalecida nas fronteiras da Europa.

— Estamos prontos para fornecer o que for necessário à Ucrânia — declarou Rutte, para quem a Rússia representa “uma ameaça direta para todos nós no Ocidente”.

O uso dos ATACMS pela Ucrânia e a revisão da doutrina nuclear russa ocorrem no mesmo dia que a guerra completa mil dias. O dia começou com um ataque russo na região fronteiriça ucraniana de Sumy, que matou sete pessoas, incluindo uma criança. O presidente Zelensky publicou um vídeo que mostra as equipes de resgate retirando corpos dos escombros e apelou aos seus aliados para “forçarem” a Rússia à paz.

Em declaração, Kiev afirmou que “nunca se submeterá aos ocupantes” e que “os militares russos serão punidos por violarem o direito internacional”. “Alcançaremos a paz através da força e do apaziguamento”, afirmou o Ministério das Relações Exteriores ucraniano em comunicado. A promessa faz referência aos crescentes apelos para que a Ucrânia se junte à mesa de negociações com a Rússia para acabar com quase três anos de guerra.

O Kremlin também prometeu derrotar a Ucrânia.

— A operação militar contra Kiev continua e será concluída — afirmou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, aos jornalistas.

A Ucrânia acusa as forças russas de uso de substâncias químicas proibidas para avançar e instou seus aliados nesta terça a responderem a um relatório da Organização para a Proibição de Armas Químicas (Opaq), que afirma ter encontrado um gás antidistúrbios proibido na linha de frente.

“O uso de produtos químicos proibidos no campo de batalha pela Rússia demonstra mais uma vez o desrespeito crônico da Rússia pelo direito internacional”, disse o Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia.

O Globo

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