Preso de maneira equivocada por não pagamento de pensão alimentícia mesmo sem ter filhos, o vendedor Gustavo Lopes, 20 anos, vive uma mistura de sentimentos: alívio, por estar em liberdade; incerteza, por não ter ideia de como foi parar na cadeia; e revolta, pela injustiça sofrida. “Eu dividi cela com outros 22 detentos. É muito ruim ser preso sem ter feito nada”, lamenta o jovem.
O que aconteceu
- Gustavo Lopes, 20 anos, foi preso em 28 de janeiro, em casa, em Taguatinga, por não pagar pensão alimentícia.
- Mesmo provando que não é pai, Gustavo questionou a prisão, mas acabou encarcerado ainda assim.
- Gustavo estava sozinho em casa quando foi detido. A família de Gustavo não foi avisada pela Justiça e nem pela polícia.
- Mãe do rapaz, a aposentada Jane Santana, 60 anos, contratou um advogado. O defensor Marco Barbosa constatou que o processo foi iniciado em São Paulo, e o mandado de prisão veio de Minas Gerais. A família e a defesa ainda tentam entender essa dinâmica.
- Em audiência de custódia, na manhã de 29 de janeiro, Gustavo foi solto. Ele teve de esperar por mais algumas horas, no entanto, até a Justiça de MG emitir alvará de soltura.
- Agora, a família busca explicações para o caso e pretende buscar indenização por danos morais.
Em entrevista ao Metrópoles Gustavo relembra o momento em que foi surpreendido por policiais em casa, na tarde do último 28 de janeiro. “Os agentes chegaram falando que havia um mandado de prisão em aberto contra mim por não pagamento de pensão. Eu questionei e disse que não tenho filhos”, explica o jovem.
“Mesmo assim, fui levado à delegacia e fiquei preso até depois da audiência de custódia, no dia 29”, prossegue Gustavo.
“Eu dividi cela com outros 22 detentos. Eu era o mais novo lá. Os homens tinham entre 25 a 60 anos, em média”, relata o vendedor. “É muito ruim ser preso sem ter feito nada. Não tinha por que eu estar lá.”
Mãe de Gustavo, a aposentada Jane Santana, 60 anos, conta que não estava em casa no momento em que o filho foi preso. “Eu fui ao Riacho Fundo com uma amiga e até deixei o celular em casa, porque eu ando de ônibus e tenho medo de ser roubada”, relembra a mulher.
Jane não recebeu nenhum comunicado da Justiça ou da Polícia Civil (PCDF) sobre a prisão do filho. “Quem me avisou foi minha vizinha. Ela tentou me ligar, mas eu só vi as notificações quando cheguei em casa, por volta das 18h”, cita.
“Tenho certeza que foi Deus quem me tirou de casa naquela tarde. Eu não iria aguentar ver meu filho sendo preso. Fiquei muito triste, muito abalada, me desesperei. Foi muito difícil”, diz a mulher.
Faltam explicações
O processo que culminou na prisão injusta do jovem brasiliense teve origem em São Paulo, em 2017, quando Gustavo tinha 12 anos. “Para que o processo tenha se iniciado em 2017, eu deveria estar devendo a tal pensão desde o ano anterior, em 2016, quando eu tinha 11 anos. Não faz o menor sentido”, comenta o vendedor. O erro foi detectado pela Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF).
Além de o processo ser de oito anos atrás, o mandado de prisão partiu da Vara de Execução de Minas Gerais, sem justificativa para tal.
O advogado da família, Marco Barbosa, explica. “O mandado de prisão veio de uma cidade mineira chamada Igarapé. Quando fomos pesquisar o processo, vimos que ele não foi encontrado na Vara de Execução de Minas Gerais, mas sim na Justiça de São Paulo”, comenta o defensor.
Este processo vindo de São Paulo, no entanto, não tem relação com Gustavo. “Não há nenhum dado dele nestes arquivos”, comenta. O advogado, portanto, desconfia que houve alguma fraude ou erro.
“É como se alguém tivesse pego esse número processual e criado um mandado de prisão com a comarca de Minas Gerais, embora o processo tenha surgido da Justiça de São Paulo. Em seguida, esse alguém teria enviado o processo para o Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões (BNMP)“, aponta o advogado.
Ainda não se sabe, portanto, por que o processo saiu de São Paulo para Minas Gerais e terminou com a prisão de Gustavo em Brasília, uma vez que os autos não possuem dados do jovem. O advogado seguirá tentando entender o caso para descobrir se de fato houve fraude ou erro.
O fato de a prisão ter sido determinada pela Justiça de Minas Gerais deixou Gustavo preso por mais algumas horas após a audiência de custódia, realizada em 29 de janeiro. “A audiência foi pela manhã, onde o juiz entendeu que houve erro. Porém, tivemos que esperar a Justiça mineira emitir meu alvará de soltura, o que só ocorreu à noite”, lamenta Gustavo.
Justiça
Para além do constrangimento e do abalo psicológico, a família teve de buscar recursos financeiros para contratar o advogado que ajudou Gustavo. “Tive que fazer um empréstimo bancário”, comenta a mãe do rapaz.
A família e a defesa não vão se contentar apenas com o alívio de ter Gustavo de volta. “Vamos procurar justiça, com certeza. Ainda está tudo muito confuso, estamos tentando entender o que aconteceu, mas queremos justiça”, crava Jane.
“Vamos pedir indenização por danos morais”, confirma o advogado Marco Barbosa.