A guerra tarifária iniciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra alguns de seus maiores parceiros comerciais nas últimas semanas, deixa dúvidas sobre qual será o próximo país a ficar na mira.
A imposição de taxas contra importados já fazia parte do discurso de Trump desde a sua campanha. Na última semana, ele cumpriu a ameaça de impor tarifas aos três principais parceiros comerciais dos Estados Unidos.
Ele anunciou tarifas de 25% sobre produtos do Canadá e do México e um adicional de 10% àquelas já em vigor sobre produtos chineses. Do total de US$ 3 trilhões importados até novembro de 2024, esses três países representam mais de 40% das compras dos EUA.
E Trump já sinalizou que seu próximo alvo será a União Europeia (UE), de onde importaram mais US$ 555 bilhões no mesmo período.
Nos últimos dois dias, México e Canadá anunciaram acordos com os EUA para suspender as tarifas por um mês. A China, por sua vez, dobrou a aposta e anunciou taxas de 10% a 15% contra os norte-americanos, enquanto representantes da UE chamaram Trump para conversas.
No Brasil, os setores exportadores do país se preocupam com medidas tarifárias, afinal os norte-americanos são o segundo maior comprador de produtos brasileiros, com mais de US$ 38 bilhões até novembro de 2024.
O país, no entanto, representa pouco mais que 1% das importações dos EUA. O que significa que, ainda que Trump tenha dito que o Brasil “cobra muito” de seus parceiros comerciais, estamos longe de ser prioridade do comércio exterior norte-americano.
Mesmo assim, especialistas consultados pelo g1 afirmam que o Brasil ainda corre riscos de ser afetado por essas tarifas. Saiba abaixo o porquê.
O Brasil pode entrar na mira de Trump?
A imposição de tarifas é uma ameaça antiga do republicano para favorecer os EUA e, para especialistas, o Brasil ainda corre alguns riscos de sofrer com taxas maiores.
Há temores, por exemplo, de que uma tarifa universal seja implementada. A ideia foi ventilada no final de janeiro pelo secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, segundo o jornal britânico “Financial Times”.
A ideia é que essa taxa começasse em 2,5% e crescesse gradativamente ao longo dos próximos meses, dando tempo para que a indústria se adaptasse e os países pudessem negociar com o governo Trump.
“Essa tarifa universal afetaria o mundo inteiro. E isso ainda poderia trazer um efeito na inflação e nos juros dos EUA, trazendo um fortalecimento do dólar”, explica Welber Barral, ex-secretário do comércio exterior e sócio-fundador da BMJ Consultores Associados.
Além disso, especialistas apontam o risco de o presidente norte-americano fazer ameaças mais pontuais para conseguir objetivos específicos. Como mostrou o g1 em dezembro, essa é uma estratégia antiga e conhecida do republicano para tentar vantagens em negociações bilaterais.
“Quando olhamos para o passado, vemos muita pressão de diversos setores, especialmente o siderúrgico, que produz um dos principais produtos importados pelos EUA”, diz Lia Valls, pesquisadora associada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
“Portanto, aceitar alguma demanda de um setor específico pode ser uma das motivações de Trump para impor taxas e tentar alguma negociação”, completa.
Brasil tem apenas 1,3% das importações dos EUA
Os especialistas reforçam, no entanto, que o Brasil não tende a estar na lista de prioridades de Trump na imposição de um “tarifaço”. A quantidade de produtos importados do Brasil pelos EUA é bem pequena em comparação com outros parceiros comerciais da maior economia do mundo.
Os últimos dados do Departamento de Comércio norte-americano indicam que o volume de importações do Brasil pelos EUA somou US$ 38,5 bilhões (aproximadamente R$ 225,9 bilhões) no ano passado até novembro. Esse valor representa apenas 1,3% do total de importações do país.
Veja a lista dos principais parceiros abaixo:
Importações e Exportações feitas pelos Estados Unidos
Dados acumulados até novembro de 2024, em bilhões de dólares *
De acordo com especialistas, Trump tem demonstrado motivações variadas para impor tarifas, muitas delas visando negociações mais vantajosas para os EUA ou garantindo que outros países se mantenham leais aos norte-americanos.
“Ficou claro que Trump vai usar da ameaça de tarifas para atingir objetivos comerciais e não comerciais. Isso aconteceu com o México e com o Canadá, por exemplo. Todos eles tiveram a ameaça da tarifa e conseguiram um prazo para negociar”, diz Barral.
Na segunda-feira, 3 de fevereiro, os acordos com os EUA para suspender as tarifas só saíram em troca de que ambos os países se comprometessem a aumentar a segurança e a fiscalização sobre o que passa por suas fronteiras, uma das principais preocupações do eleitorado de Trump.
O Brasil pode sofrer algum impacto econômico?
De acordo com especialistas consultados pelo g1, mesmo que o Brasil não seja diretamente taxado por Trump, o país ainda deve sofrer os efeitos econômicos globais que esse “tarifaço” pode trazer.
Primeiro, a agenda protecionista do republicano, somada à imposição de tarifas, pode aumentar a inflação nos EUA. Se isso acontecer, o Federal Reserve (Fed), o banco central norte-americano, pode aumentar as taxas de juros para controlar os preços, e assim impulsionar o dólar.
O dólar mais alto tende a pressionar a inflação no Brasil, o que também pode levar a juros mais altos por aqui.
“Com esse vaivém e com as ameaças, Trump acaba paralisando o mundo, tanto nas operações de comércio quanto nas decisões de investimento. O futuro é incerto e isso também causa uma deterioração das expectativas”, diz Valls.
Além disso, há efeitos mais difíceis de serem mensurados, como a possibilidade de mais produtos chineses (a preços baixíssimos) sendo vendidos globalmente e os impactos disso nas indústrias locais.
“Precisaremos acompanhar de perto quais serão os próximos passos de Trump nesse sentido e se haverá algum avanço na proposta de uma tarifa universal”, conclui Barral.