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📅 Última atualização: sex., 07.11.25 – 21h10
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Terminou a eleição. Os santinhos foram varridos das calçadas, os jingles sumiram dos carros de som, as bandeiras desbotaram nos postes esquecidos. Mas o palanque — ah, o palanque — esse continua de pé. Firme. Inabalável. Como se a urna ainda estivesse aberta e o voto ainda coubesse na boca de quem não sabe calar.

No interior, onde todo mundo conhece todo mundo pelo apelido de infância e pela filiação política do avô, a eleição não acaba em outubro. Ela se arrasta pelos corredores do hospital, pela fila do banco, pelo balcão da padaria. Vira assunto de velório, de batizado, de fila de vacinação. O calendário oficial diz que o pleito encerrou há dois anos; a praça central, com seus grupinhos de braços cruzados e olhares atravessados, conta outra história.

Quem perdeu carrega a derrota como quem carrega um espinho na carne — dói, inflama, mas não tira. Não consegue. Há uma recusa quase religiosa em aceitar o veredicto das urnas. Então o derrotado se reinventa: vira fiscal implacável, comentarista de obra pública, auditor de buraco em estrada. Cada poste trocado é dinheiro mal gasto. Cada inauguração é inauguração de coisa que “já existia”. Cada benefício que chega ao município é mérito de Brasília, de Deus, do acaso — nunca, jamais, em hipótese alguma, de quem venceu.

É uma ginástica mental impressionante: o sujeito que há três anos prometia mundos e fundos agora descobre defeito em tudo que seu adversário entrega. A praça ficou bonita? “Mas e a saúde?” A saúde melhorou? “Mas e a educação?” A educação avançou? “Mas e o sorriso dele, que é falso?” O critério se move conforme a necessidade de criticar. A régua é de borracha.

Quem ganhou, por sua vez, não fica muito atrás na pequenez. Vencer não bastou. É preciso lembrar, a cada esquina, a cada postagem, a cada inauguração de meio-fio, que o outro lado perdeu. Há um prazer quase infantil em esfregar a vitória na cara do adversário. “Tá vendo essa ambulância? É porque vocês perderam.” “Tá vendo essa quadra? É porque o povo escolheu a gente.” O benefício que deveria ser de todos vira troféu de uns contra outros. A conquista coletiva é sequestrada pelo ego partidário.

E assim o município se divide não entre quem precisa e quem pode ajudar, mas entre quem votou certo e quem votou errado. A ambulância nova, que deveria socorrer qualquer cidadão, passa a carregar uma bandeira invisível. A vaga na creche, que deveria acolher qualquer criança, parece ter cor política. O próprio ar da cidade fica carregado de lado.

Mas o fenômeno mais curioso — e talvez mais triste — acontece nas redes sociais, esse palanque de bolso que cada um carrega no celular.

Ilustração: Blog do Halder

Ali, os soldados mais fervorosos não são os candidatos, nem os vereadores, nem os prefeitos. São os admiradores. Os correligionários anônimos. Os perfis com foto de paisagem e nome de batismo que acordam às cinco da manhã para comentar na publicação do adversário. São eles que mantêm a fogueira acesa enquanto os próprios gestores, muitas vezes, nem sabem que há guerra.

O prefeito está dormindo. O vereador está jantando. O ex-candidato está tocando a vida. Mas o Zé do Mercadinho e a Dona Maria do Crochê estão lá, às onze da noite, trocando farpas em publicações de três dias atrás. “Vai trabalhar!” — diz um, sem perceber que também está ali, às onze da noite, em vez de descansar. “Na época do outro era pior!” — responde o outro, como se miséria comparada fosse argumento de alguma coisa.

É uma guerra por procuração. Uma briga de torcida organizada em que os jogadores já foram embora do estádio, mas a arquibancada continua quebrando cadeira.

O que se perde nesse fogo cruzado de vaidades?

Perde-se a noção de que política, em sua essência, deveria ser o esforço coletivo para que todos vivam melhor. Perde-se a capacidade de reconhecer um acerto do adversário sem que isso seja traição. Perde-se a humildade de admitir um erro do próprio lado sem que isso seja fraqueza. Perde-se a chance de cobrar com seriedade, de fiscalizar com critério, de propor com responsabilidade.

Quando tudo é “nós contra eles”, ninguém cobra de verdade — porque cobrar o próprio lado é munição para o inimigo. E ninguém reconhece de verdade — porque reconhecer o outro lado é deserção.

O município vira refém de egos. A cidade para enquanto os grupinhos disputam quem tem razão. E a razão, coitada, há muito foi embora, cansada de ser usada como desculpa para mesquinharia.

Há algo de profundamente rebaixado nessa dinâmica. Não é paixão cívica — é briga de comadres com verniz ideológico. Não é fiscalização popular — é rancor fantasiado de cidadania. Não é defesa de projeto — é torcida de time que perdeu a noção do jogo.

Porque o jogo, no fundo, não é sobre qual grupo político vai prevalecer. O jogo é sobre se a escola vai funcionar, se o posto de saúde vai atender, se a estrada vai ser asfaltada, se a cidade vai ter futuro. E esse jogo não se ganha com meme de madrugada, nem com indireta em rede social, nem com risadinha no canto da praça.

Esse jogo se ganha com gente adulta que aceita resultado, que cobra com critério, que reconhece com honestidade, que entende que o mandato é temporário, mas a cidade é permanente.

Desmontem o palanque. Não porque a eleição acabou — ela acaba e volta, como as estações. Mas porque vocês são maiores do que a briga que escolheram comprar. Porque a cidade precisa mais de cidadãos do que de militantes. Porque os filhos de vocês estão vendo. Porque a história do lugar de vocês merece mais do que ser lembrada pelas fofocas de Facebook.

Guardem a bandeira. Não a joguem fora — ela representa algo que importou para vocês, e isso tem valor. Mas guardem. Deixem-na descansar até que seja hora de tirá-la de novo, com propostas novas, com energia nova, com a dignidade de quem disputa sem destruir.

E quando a vontade de cutucar vier — e ela vem, porque somos humanos e a vingança é doce —, perguntem a si mesmos: isso vai fazer minha cidade melhor?

Se a resposta for não, fechem o aplicativo. Vão dormir. Deixem o prefeito e o ex-prefeito resolverem as coisas deles, se é que há algo para resolver. Vocês têm mais o que fazer.

A vida é curta. A eleição é longa. Mas a pequenez é opcional.

Ou vocês acham mesmo que São Pedro, lá na porta, vai perguntar em quem vocês votaram em 2024?

Blog do Halder

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