O fim não está próximo. Especialistas ouvidos pelo site da UOL afirmam que o ataque dos Estados Unidos a instalações nucleares do Irã não deve deflagrar a Terceira Guerra mundial.

O que aconteceu
As superpotências militares não devem se engajar no conflito. Mas existe a possibilidade de o Oriente Médio ser envolvido na guerra e ter como consequência uma severa crise econômica mundial.
Mesmo com o Irã se reunindo com a Rússia, os países mais poderosos não têm interesse ou capacidade militar para iniciar um Terceira Guerra. A avaliação é de Kai Enno Lehmann, professor de Relações Internacionais da USP (Universidade de São Paulo).
O especialista divide os principais atores internacionais em dois grupos. China e Estados Unidos têm poderio militar para sustentar uma guerra em escala global, mas um conflito desta magnitude é contra seus interesses.
A Europa e a Rússia não possuem capacidade militar. Lehmann lembra que Moscou está envolvida em custosa guerra contra a Ucrânia. A Europa não tem armas em quantidade suficiente para tal empreitada.
“Eu não vejo que haja interesse [na Terceira Guerra] por parte da China e por parte dos Estados Unidos. E nem há capacidade dos europeus e da Rússia em se envolver numa guerra mundial.” Kai Enno Lehmann, professor da USP
China e Rússia com Irã
Atualmente, a Europa sequer tem consenso sobre como reagir aos ataques dos Estados Unidos. Enquanto isso, os países do bloco se dividem entre aprovar e criticar os bombardeios. Como consequência, a falta de uma posição uniforme inviabiliza influenciar o conflito, explica Carolina Pavese, PhD em Relações Internacionais e professora do Instituto Mauá.
Além disso, a especialista também não acredita em uma possível Terceira Guerra Mundial. Segundo ela, as superpotências se envolveram em conflitos regionais, mas a presença delas não evoluiu, até agora, para um confronto direto entre os Estados Unidos e seus adversários.
Pavese cita o caso da Síria, onde russos e americanos estiveram em lados opostos durante 16 anos. Além disso, a guerra da Ucrânia é outro exemplo relevante, evidenciando o forte envolvimento de atores globais no cenário atual.
A Otan, composta por americanos e europeus, fornece armas para Ucrânia. A China dá apoio diplomático à Rússia e existe suspeita que também entregue armas. Mesmo assim, a Terceira Guerra Mundial nunca esteve no horizonte, ressalta a PhD em Relações Internacionais.
Moderação com os Estados Unidos
Faz parte da política russa e chinesa evitar atritos com os Estados Unidos. Esta situação afasta risco da Terceira Guerra Mundial, afirma Fernando Brancoli, professor de Segurança Internacional e de Geopolítica da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Ele ressalta que a China vai até o limite do possível. Antes dos bombardeios, o país já dava apoio logístico aos iranianos. Um exemplo, é o fornecimento de sais usados em mísseis. “No entanto, não há indicação de envio de tropas ou armas pesadas”.
Moscou entrega apoio de inteligência e cibernético. Também há respaldo diplomático por parte de Moscou, como Vladimir Putin receber o chanceler do Irã. Mas ações mais robustas não estão no horizonte de russos e chineses.
“Ambos evitam envolvimento direto para não arriscar suas relações com os Estados Unidos.” Fernando Brancoli, professor da UFRJ.
Interesses contraditórios da China
Além disso, outro fator que reduz o risco de uma guerra mundial é a situação chinesa. Dona de um grande parque industrial e vigorosa nas exportações, a China não tem interesse em afundar o mundo numa crise econômica, na avaliação do professor da USP Kai Enno Lehmann.
Mas Pequim pode ganhar com um conflito envolvendo os Estados Unidos. Lehmann ressalta que a China não esconde que deseja assumir o protagonismo mundial e o Irã arrastar os americanos para uma guerra regional pode ser uma forma de enfraquecer Washington.
O raciocínio parte da hipótese de uma guerra longa e custosa, ou seja, nos mesmo moldes do que ocorre com a Rússia na Ucrânia. Nesse cenário, o conflito drenaria recursos e capital político dos Estados Unidos. No entanto, para que isso aconteça, os iranianos precisariam de meios para lutar, como armas.
“São interesses contraditórios e não é possível prever o que será feito.” Kai Enno Lehmann, professor da USP.
Próximos passos do Irã
O tamanho que a guerra tomará depende de como o Irã vai reagir. Por isso, o parlamento do país aprovou recentemente o fechamento do Estreito de Ormuz. Trata-se, afinal, do corredor marítimo mais importante do mundo, por onde passa cerca de 20% do petróleo mundial.
Agora a decisão será avaliada pelo Conselho de Segurança do Líder Supremo do Irã. A efetivação da medida teria impacto global e afetaria demais o comércio internacional.
A avaliação dos especialistas é de que uma reação iraniana aos bombardeios é necessária. O governo ficará fragilizado perante os adversários se não responder aos ataques. Também existe a pressão interna para demonstrar força.
Mas fechar o Estreito de Ormuz pode comprometer a posição do Irã com aliados. A rota marítima é usada por países vizinhos e a medida dificulta a obtenção de apoio, explica a Phd em Relações Internacionais Carolina Pavese.
China, Rússia e Índia também seriam afetados. Todos são aliados e podem ser muito prejudicados com aumento estratosférico do preço do petróleo, ressalta a professora.
Pavese lembra que há alternativas. Paramilitares alinhados com o Irã devem ser acionados. Dessa maneira, ela cita grupos que operam em países como Iêmen e Líbano. Também existe a possibilidade de Teerã abandonar tratados que regulam a produção de armas nucleares.
Implicações nos EUA
Donald Trump vai enfrentar consequências políticas e econômicas. O conflito ocorre numa região produtora de petróleo, que pode ter os preços subindo bastante, declara o professor da UFRJ Fernando Brancoli.
A situação pressiona a inflação nos Estados Unidos e existe risco de reduzir o crescimento. A possibilidade de medidas protecionistas se torna maior e pode haver pressão por corte de impostos.
O risco político é ter bombardeado o Irã sem consultar o Legislativo. Mesmo políticos do Partido Republicano foram contra o ataque. O professor Lehmann considera improvável um impeachment. Mas o descontentamento até de aliados fará o restante da administração Trump mais complicado.