
Acontece, amanhã, 20 de agosto, uma audiência pública na Câmara dos Deputados. Será para discutir uma pauta que tem movimentado o mercado de criptoativos e autoridades monetárias ao redor do mundo. Trata-se da constituição de reservas soberanas com Bitcoin.
A Comissão de Desenvolvimento Econômico (CDE) vai ouvir representantes do segmento de criptoativos e do sistema financeiro tradicional. Eles visam avaliar a viabilidade de o Brasil estabelecer uma reserva de Bitcoins. Isso seria assim como o ouro e o dólar.
A proposta
A proposta foi apresentada pelo deputado Eros Biondini (PL-MG), no Projeto de Lei 4501/24. Este projeto cria a Reserva Estratégica Soberana de Bitcoins (RESBit). Pela proposta, a gestão da RESBit ficaria a cargo do Banco Central (BC), junto com o Ministério da Fazenda. Além disso, o estoque de Bitcoins ficaria limitado a 5% das reservas brasileiras. A aquisição seria realizada de forma “planejada e gradual”.
No texto do projeto de lei, Biondini justifica que a RESBit se destinará a “diversificar os ativos financeiros do Tesouro Nacional. Sugerindo também proteger as reservas internacionais contra flutuações cambiais e riscos geopolíticos”. Além disso, defende que possa “fomentar o uso de tecnologias blockchain no setor público e privado”.
O mais recente Relatório de Gestão de Reservas Internacionais se publicou em março pelo Banco Central. Com dados fechados de dezembro de 2024, aponta que as reservas brasileiras em moedas estrangeiras somavam cerca de US$ 330 bilhões.
Desse montante, 78,45% estavam lastreados em dólar norte-americano (USD), 5,31% em renminbi (CNY, a moeda chinesa), 5,23% em euro (EUR), 3,69% em libra esterlina (GBP, do Reino Unido), 3,55% em ouro, 1,73% em iene (JPY), 1,05% em dólar canadense (CAD) e 0,99% em dólar australiano (AUD).
Força do Bitcoin
Pela proposta de até 5%, a reserva brasileira em Bitcoin poderia ficar acima da quantidade de algumas moedas fortes, como a libra e o iene. Inclusive de ouro, considerado um ativo de proteção.
“A alocação das reservas internacionais é feita de acordo com o tripé segurança, liquidez e rentabilidade, nessa ordem. A política de investimentos é definida pela Diretoria Colegiada do Banco Central”, explica a autoridade monetária. “As reservas internacionais funcionam como uma espécie de seguro. Assim, o país faz frente às suas obrigações no exterior e a choques de natureza externa, tais como crises cambiais e interrupções nos fluxos de capital para o país.”
A formação de reservas soberanas de Bitcoin é um dos gatilhos defendidos e aguardados pelos agentes do mercado cripto. Isso pode ocorrer para a primeira e principal representante do segmento alcançar novos patamares de preço. Estima-se que podem superar os US$ 200 mil, segundo algumas estimativas.
Expectativas
No entanto, a realidade tem frustrado as expectativas . A possibilidade de compra direta de Bitcoin pelo governo americano para compor reservas do Tesouro foi um dos principais alicerces que levaram à forte valorização no início deste ano. A promessa de Donald Trump, em sua campanha presidencial, se cumpriu, mas em parte.
O decreto de Trump, assinado em março passado, oficializou a reserva estratégica soberana de Bitcoin. Porém, não estabeleceu que o governo fosse a mercado realizar compras diretas. Ficou restrito às quantidades apreendidas pelo Departamento de Justiça em ações contra crimes e práticas ilícitas.
Na semana passada, declarações do secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, sepultaram de vez as expectativas do mercado. Bessent reforçou que as reservas americanas vão se compor apenas por Bitcoins apreendidos e que o governo não os colocará à venda.
As iniciativas em torno da formação de reservas soberanas de Bitcoin por meio de compras diretas têm se concentrado em países de menor porte econômico. Países como El Salvador e o Butão são exemplos. O país da América Central possui 6.135 BTC (cerca de US$ 705 milhões) no Tesouro e o reino do Sudeste Asiático tem 7.486 BTC (pouco mais de US$ 860 milhões), de acordo com o rastreador de dados Bitcoin Reserve Tracker.
A plataforma informa ainda que países como Reino Unido, China e Finlândia também possuem uma grande quantidade de Bitcoins. Estes são oriundos de apreensões, mas não compõem suas reservas soberanas.
Em julho do ano passado, a Alemanha provocou uma forte queda no preço do Bitcoin. Isso ocorreu ao liquidar cerca de 16.000 BTC apreendidos em diversas operações contra crimes e ilícitos. Segundo agências internacionais, os alemães venderam o equivalente a quase US$ 1 bilhão, em apenas oito horas.
Caminho a se percorrer
A volatilidade característica do mercado de cripotativos é o principal argumento contra a formação de reservas em Bitcoin. Em janeiro deste ano, Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu (BCE) declarou que Bitcoin não vai fazer parte das reservas da autoridade monetária da União Europeia. “Reservas devem ser líquidas, seguras, protegidas e sem a suspeita de lavagem de dinheiro e outras atividades ilegais”, disse, à época, em entrevista coletiva.
O projeto de lei sobre as reservas brasileiras ainda tem um longo caminho a percorrer no poder legislativo. Além da CDE, será analisado pelas comissões de Ciência, Tecnologia e Inovação (CCTI), de Finanças e Tributação (CFT) e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), de acordo com a Agência Câmara de Notícias. Com pareceres favoráveis, o texto pode ir para votação na Câmara e no Senado. Contudo, não há prazos definidos para cada uma dessas etapas.