
Ícones da música nordestina e sertaneja, Flávio José e Leonardo demonstraram incômodo com a forma como artistas têm regravado composições consagradas nos festejos juninos e em outros contextos populares. No São João 2025 de Campina Grande, Flávio José falou em “falta de respeito” com regravações que mudam as melodias. Por outro lado, Leonardo pontuou que “não é a favor” de reinterpretações que modifiquem melodias originais.
Em coletiva de imprensa realizada na noite desta quinta-feira (12), Dia dos Namorados, data que antecede o dia de Santo Antônio, os dois artistas classificaram como desrespeitosa a prática de alterar melodias e estruturas originais de canções. Instantes antes das apresentações no Parque do Povo, no São João de Campina Grande, eles expuseram a questão.
Referência do forró tradicional, Flávio José foi enfático ao comentar o impacto dessas reinterpretações. Ele disse que elas causam em quem ajudou a construir o repertório musical das festas juninas. Conforme o cantor, muitas dessas versões não representam uma inovação. Elas contribuem para a descaracterização da essência das obras.
“Eu não chamo de inovação, chamo de invasão. Como não posso mudar, tenho que aprender a conviver”, afirmou, ao analisar a presença cada vez maior de ritmos contemporâneos no espaço originalmente ocupado por gêneros como forró pé de serra, xote e baião.
Apesar da crítica, o cantor reconheceu que a busca por músicas de qualidade do passado revela uma certa valorização da boa composição. Ele lamenta a forma como isso tem ocorrido. “Na verdade, eu diria que bateram no teto, já gravaram de tudo. Agora não tem mais o que gravar e estão vindo refazer uma releitura de música de qualidade. Isso é importante também”, avaliou.
Subiu o tom
O tom mais duro surgiu ao falar de músicas de sua autoria ou do seu repertório afetivo. Estas ganharam versões que, conforme ele, rompem com o sentimento original das composições.
“Sempre que regravam eu acho legal, agora só acho uma falta de respeito quando regravam de uma maneira diferente do que foi feito. Porque não é brincadeira você pegar uma música ‘Seu olhar não mente’, ‘Tareco e mariola’ e tocar nesses ritmos aí que se dizem atuais e inovadores. Eu fico triste pra caramba. Porque a gente faz com tanto carinho e a gente vê tudo sendo tocado diferente. Me dá uma tristeza medonha”, declarou.
Leonardo, por sua vez, destacou que mudanças de estilo sempre fizeram parte do ciclo da música popular. Ele reconheceu que sua própria geração também representou uma ruptura na época em que começou a fazer sucesso ao lado do irmão Leandro. No entanto, o cantor sertanejo mostrou desconforto com o modo como algumas releituras contemporâneas têm modificado de forma radical a melodia.
“Mudou muito o estilo da música sertaneja, como também mudou na época que Leandro e Leonardo começou a fazer sucesso. Essa galera nova aí tão fazendo muito bem, regravando muita coisa dos anos 90. Eu fico feliz de ver que estão dando sequência no que começou há anos atrás”, afirmou o cantor.
Apesar do reconhecimento ao movimento de resgate, ele defende que certos elementos devem ser preservados para que a música continue sendo imediatamente identificável.
“Eu não gosto que mexam nas minhas músicas. Acho que uma boa música começa quando o cara dá o primeiro acorde num teclado, o primeiro acorde num violão e você já sabe que música o cara vai cantar. E muitos deles mudam radicalmente a melodia. Eu praticamente não sou a favor disso”, concluiu.
Amor em forma de forró – e sertanejo
A noite do Dia dos Namorados, 12 de junho, no São João de Campina Grande, foi marcada por uma mistura de ritmos. Nela, o amor era o tema central das canções.
O paraibano Flávio José, ícone da cultura e música nordestina, praticamente abriu os trabalhos da noite. Com um Parque do Povo já bem cheio, cantou algumas músicas que são sucesso em seu repertório, como “Tareco e Mariola”, “Seu olhar não mente” e “Natureza das Coisas”. Nesse meio tempo, ele fez uso de canções do período junino, como as utilizadas para animar quadrilhas juninas, para animar os forrozeiros.
Com o avanço da idade, a voz já sente alguns efeitos do tempo. Por isso, o cantor faz uso das habilidades com a sanfona para enriquecer a apresentação.
O cantor Leonardo foi uma das atrações mais aguardadas da noite do Dia dos Namorados no Parque do Povo. Com um show de cerca de duas horas, o cantor sertanejo trouxe no repertório “Deixaria tudo”, “Temporal de amor” e “Talismã”. Contudo, o que ficou marcado na apresentação de Leonardo foi a dificuldade do cantor em interpretar as músicas de forma integral. Jogando para o público a responsabilidade de continuar o repertório. Para preencher o espaço musical, ele utilizava de “gritos” no decorrer das canções para animar o público. O balé auxiliou na composição do palco e, de certa forma, ajudou na performance do cantor sertanejo.
Novo projeto
Antes do show, o cantor Leonardo comentou sobre a gravação do seu novo projeto audiovisual, o DVD “Uma História Sem Fim”. O trabalho reúne canções inéditas e outras que marcaram sua trajetória. Esta trajetória iniciou em 1985 ao lado do irmão Leandro, que morreu em 1998. Embora o DVD ainda não tenha sido lançado, Leonardo revelou, durante coletiva de imprensa no São João de Campina Grande, que não ficou satisfeito com os arranjos utilizados na gravação. Ele pretende fazer modificações antes de disponibilizá-lo ao público.
“No meu próprio DVD que vai sair em 20 dias foi mudado alguma coisa, mas confesso que não gostei. Vai ficar diferente e eu confesso que estou chateado com isso, mas voltando do São João para lá vou ver se eu mudo alguma coisa e volto ao que era original”, explicou Leonardo.
Para encerrar a noite dos Namorados no São João de Campina Grande, já na madrugada da sexta-feira (13), a banda Seu Desejo, com repertório recheado de clássicos do forró romântico, se apresentou no Maior São João do Mundo. A banda mesclou músicas autorais da Seu Desejo, mas trouxe regravações de músicas da época quando os dois artistas da banda faziam parte de outra banda de forró, a Desejo de Menina. Próximo ao fim do show, trouxeram músicas de quadrilhas juninas num bloco no estilo de arraiá.