A cúpula do Brics, marcada para acontecer neste domingo, 6, e segunda, 7, no Rio de Janeiro, vai ocorrer sem as presenças das duas principais lideranças do bloco: Xi Jinping, da China, e Vladimir Putin, da Rússia. As ausências são um retrato de um encontro ‘esvaziado’.
Além de comprometer a força e a capacidade decisória do encontro, o esvaziamento da cúpula representa um problema para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Isso afeta tanto na política externa quanto na política interna, conforme a avaliação de especialistas. Esta foi feita após consulta pelo site Terra.

Vitrine diplomática
João Alfredo Nyegray, professor de Geopolítica e Negócios Internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), explica que a realização da cúpula no Rio de Janeiro era pensada como uma vitrine diplomática para o Brasil e para o próprio Lula. Nesse sentido, a ausência dos dois líderes compromete o capital simbólico e político do encontro.
“Esse esvaziamento fragiliza a imagem de liderança global que o presidente busca projetar, desidrata o simbolismo da presidência brasileira do bloco e enfraquece sua narrativa de protagonismo internacional. Isso ocorre sobretudo num contexto em que enfrenta desgaste interno e críticas crescentes do cenário externo”, avalia Nyegray.
Leonardo Paz Neves, professor de Relações Internacionais do Ibmec-RJ, pontua que o esvaziamento da cúpula não é um problema que atinge diretamente Lula, mas enfraquece o Brasil. Ele avalia que havia interesse do governo brasileiro em demonstrar capacidade de liderança regional e protagonismo internacional. Assim, mostrando que o País consegue organizar encontros de alto nível e articular iniciativas relevantes.
“A ausência das principais lideranças do bloco arranha um pouco esse prestígio. Não necessariamente o de Lula pessoalmente, mas do governo brasileiro como um todo. Afinal, a presença de líderes como Xi Jinping e Putin ampliariam a visibilidade do evento. Além disso, reforçariam a imagem do Brasil como articulador de temas importantes na agenda internacional”, enfatiza.
Justificativas das ausências
De acordo com informações publicadas pelo jornal South China Morning Post, Pequim informou ao governo brasileiro que Xi Jinping não faria parte do encontro no Brasil porque tinha um conflito de agenda. Porém, garantiu que seria representado pelo primeiro-ministro chinês, Li Qiang.
O Kremlin, por sua vez, afirmou que Putin não comparecerá ao evento devido a um mandado de prisão pendente emitido contra ele pelo Tribunal Penal Internacional (TPI). O Brasil, como signatário do tribunal, deveria acatar a decisão. Isso impõe que precisaria prender o líder russo assim que pisasse no território brasileiro.
Impedimento
Para Leonardo Paz Neves, a ausência de Vladimir Putin não é um sinal de desinteresse dele pelo Brics. Na verdade, trata-se de um impedimento concreto. “Ele é alvo de um mandado de prisão do TPI. Esse fato dificulta sua presença em eventos internacionais para não gerar constrangimento aos países anfitriões”.
Já a ausência de Xi Jinping é mais simbólica. Segundo Paz Neves, indica que o líder chinês está priorizando outras agendas. Mesmo assim, a China teve uma vitória importante recentemente com a ampliação do grupo — uma pauta estratégica tanto para os chineses quanto para os russos, e que ia de encontro aos interesses do Brasil.
“A China parece estar focada em desafios internos e externos mais imediatos, como a questão de Taiwan, a recuperação econômica e as tensões comerciais com os Estados Unidos. A ausência de Xi, que representa a maior economia do bloco e o país com mais peso político, reduz o brilho e a importância da cúpula, mesmo que indiretamente”, afirma.
João Alfredo Nyegray pondera que ainda que o governo tente minimizar o esvaziamento com argumentos de que a ausência de líderes é resultado de “problemas regionais” ou “protocolos de segurança”, a realidade é que “a cúpula do Brics no Rio perde seu valor estratégico como ponto de inflexão geopolítica”.
Pressão interna
O esvaziamento da cúpula ocorre também em um contexto de queda de popularidade interna do presidente. Segundo a pesquisa Genial/Quaest, a desaprovação do governo Lula oscilou de 56% em março para 57% em maio, e a aprovação foi de 41% para 40%.
Além disso, há a crescente pressão do Congresso. Este recentemente derrubou o decreto de aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Derrotado no parlamento, Lula foi ao Supremo Tribunal Federal (STF). Na sexta-feira, 4, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu os efeitos de todos os decretos que tratam sobre o IOF. Além disso, determinou uma audiência de conciliação entre governo e Congresso sobre o tema no próximo dia 15.